segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Sou Eu (Luanne)

Sou Eu (Luanne)
Moacir Santos / Nei Lopes

Se um clarão lilás te banhar de luz
não te acanhes não, sou eu
Se uma estranha paz te vestir de azul
nao te espantes não, sou eu

Se descer dos céus o dragão lunar
manda me chamar pelo amor de Deus
pois teu anjo bom
teu ogum ege
teu alá bedé sou

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Lições dos dias de chuva

Dias de chuva normalmente me chateiam.
A falta da luz do sol, a terra molhada, a falta do canto dos pássaros, os sons da cidade que mudam, tudo é diferente.
Ao mesmo tempo que chateia me faz perceptivo a outras coisas que passariam sem eu prestar muita atenção.
Agora, por exemplo, parei o estudo o trabalho e presto atenção a cada gestinho dela, enquanto escrevo.
Ela tem as mãozinhas pequeninas, é baixinha, deve estar até meio gripada mas é linda.
Ela prepara o almoço, eu escrevo.
O jeito com que ela escolhe cada ingrediente é encantador.
Só, absorvida por seus pensamentos, vai enchendo a casa de perfumes.
Escolhe a couve-flor e a corta em pedacinhos pequenos.
Tempera o feijão, me serve um mate.
Eu aqui, só, absorvido em projetos, formas, texturas e preços das coisas e serviços.
Compartilhamos dias de chuva, de sol, ventos fortes e brisas; dias de saudades e esperanças.
Ela é linda, com suas mãos pequeninas, baixinha e é dona de um coração que não cabe no peito.
Tranquilas, calmas e cheias de amor, as duas, ela e a chuva, logo trarão a bonança.


Rodrigo Soares Rodrigues, manhã do dia 26 de agosto de 2013, Novo Hamburgo.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

A espera

A notícia que não chega corta tanto quanto o vento do inverno
Frio, insípido, incolor-e-cinzento
Sofá é companheiro, cais
Ela, longe, não dá sinal
Eu, conectando esperando...
Ela busca outros horizontes, não sei se para mais perto ou mais longe de mim, talvez infinitamente distante
Ah coração, quanto tempo demoraste para ganhar forças, destruir muros, barreiras
Ah coração, tu que te abriu, reluziu, te encheu de luz e calor, driblou a razão
Ah coração, tu que agora sofres, apertado com o cachecol de lã que não aquece
Ah coração, tu que agora espera espera espera
Quiçá te abrirás de novo, sentirá, emanará luz e calor
Essa dúvida da relação espaço-tempo-sentimento
Para tantas relações de afeto, amor, amizade essa relação não importa, se liquefaz
Para o amor que se quer sentir na carne, arder em brasa, será possível?
Será que a distância congelará tua luz, teu calor, tua conexão?
O som do piano, do teclado do computador, nada mais
Quase ouço o telefone tocando, serias tu, meu amor, me chamando?
Não chamas
Te vais
Longe de mim
Distante de mim
Te quero aqui, agora
Sinto que fiz grande acerto em apostar nesse amor
Me fez um homem melhor, mais presente, mais calmo e tranquilo
O sino da igreja dobra, gente que passa na rua,
Só não passa essa angústia, essa dor, estação de frio, 
Talvez seja um indício, pista com som de "vai te acostumando"
Aqui ao meu lado, ninguém
Nem tu, nem mesmo eu, nem, nem, nem...

Rodrigo Soares Rodrigues, Novo Hamburgo, tarde de 19 de julho de 2013.

terça-feira, 9 de julho de 2013

A menina do colar da China

A linda menina recebe um colar que veio da China
Sim, lá de longe, 
Lá depois da curva do vento e da curva da chuva
recebe um colar que veio da China, a menina

Ela, a linda menina, comprou o tal colar que veio da China
Não usou moeda, carteira ou dinheiro
mas rodou o mundo inteiro o lindo colar da menina

É de passarinho, pássaro, ser alado, o colar da tal menina
Lindo, ele, feito em metal, quiçá platina
Veio de longe, andou trás dos montes
Cruzou terra mar, andou "três ontontes"
Só pra colocar um sorriso, um sorriso e rima na tarde da menina

Ela olha frente ao espelho se reflete linda
Quase mulher vê-se a menina
Com seu colar vindo da china
Qual porcelana, incenso e mirra
 Veio de longe e pra longe leva meu pensamento, minha agonia.

Rodrigo Soares Rodrigues, Novo Hamburgo, noite de 9 de julho de 2013.


domingo, 17 de fevereiro de 2013

Vida que vem

De repente ele vê onde está
Ele, bendito fruto entre damas, somente damas
Olha em volta e vê mulheres que esperam frutos ou cuidam do seu sexo
Por dentro e só para ele sorri e pensa:
"Ó quanta vida, quanto cheiro de vida, suor de vida
Ó quanto sorriso e felicidade
O sorriso do avô, da avó, do pai, irmão, irmã
Ó quantas noites em claro e sem sono vêm por aí
Tal como em claro e sem sono foi a quente, de cheiro, suor e êxtase noite do plantio da semente
Tal semente também pode ter sido plantada em plena manhã de segunda-feira, quase em pecado anticapitalista
Quanto beijo, abraço e "ai, é a tua cara" vem por aí
Quanta flor e bordadinhos com o nome da criança e quantos nãos vêm por aí, díficil arte de deixar aprender e sorver a vida
Vida essa que lentamente se atrasa e torna tão relativo o tempo que gera pequeninas eternidades no tempo da espera do querido ente, semente, nascente primeiro lactente depois adolescente e vivente."
Bendito sejam os frutos de tantos ventres!


Rodrigo Soares Rodrigues, Novo Hamburgo, 17 de fevereiro de 2013.

Texto escrito pós visita a um consultório ginecológico.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Cinema na Anita

“Tchê. Cheguei agora do Alegrete e ouvi falar de uns malucos que querem mudar o mundo começando aqui pela capital. 

Me contaram que até sessão de cinema na rua eles fazem, fui ver. 

Cheguei lá e me avisaram que todo aquele povo estava reunido por que vai tê uma grande obra pra Copa do Mundo, fiquei pensando: o que tem a ver futebol, mobilidade urbana e árvores cortadas? Achei tudo muito estranho, mas como era coisa de gente modernosa, comecei a reparar nas cosas que estavam em volta, nos tipos e atitudes das pessoas. 

Vi muita coisa que nunca tinha visto, olha que eu ando por esse Rio Grande. 

Prá começo da conversa um monte de gente na rua, bebê, velho, novo. Cadeira de praia, travesseiro, cobertor, almofada, parecia um piquenique. 

Bicicleta tinha de tudo que é jeito, barra forte, barra circular, umas de quadro de carbono, cecizinha, uma que diz que dá pra dobrar e tudo o mais. 

Lá pelas tantas um bigodudo achou que podia coordenar o trânsito, e tem mais, fez bonito, poderia muito bem ensinar quem é pago pra isso! Fez tudo na elegância e com sorriso no rosto. Gente de tudo que é tipo. Tinha uma moça bonita de short rosa e camiseta preta com uns escrito: Tá foda viver. 

Gente de pés descalços, de salto alto, havaianas, alpargata. 

Gente com máquina de retrato na mão, muita gente tirando retrato, gente filmando, parece que até os da TV “que faz por você” estavam por lá, cosa de louco mesmo. 

A mãe dizia pro piá: pode escrever e desenhar no asfalto sim, mas desenha bonito pros retratista registrarem teu desenho. E se for escrever, escreva uma palavra difícil tipo honestidade, empatia, gentileza. 

Na tela de cinema filme de Copenhague, Holanda, Brasília e São Paulo. Uma jornalista, ativista, ciclista andando de bicicleta pelas cidades e falando com gente importante, mostrando como outras gentes e cidades revolucionaram seu jeito de se locomover com vontade política, atitude, pensamento de longo prazo. Gente a fim de possuir e ser dona da cidade onde vive, a fim de ir e voltar de bicicleta ou de transporte público de muita qualidade, parece que é o único jeito viável daqui pra frente. 

Em São Paulo, o retrato de um colapso muito próximo, da grande chance do sujeito querer ir pro trabalho e não conseguir, só pelo fato de estar numa cidade que têm automóveis demais. Pra quem vem de longe como eu parece mentira, mas é a mais dura realidade. 

Ouvi de tudo mesmo, coisa que não se ouve toda hora, gente dizendo “com licença”, “muito obrigado”, “que bom te ver”, “parabéns pela iniciativa”, “que bom que tu veio”, sabe, tipo melodia de música bonita. 

O casal que distribuía pipoca feita ali mesmo, ele de barra forte, ela de saia rodada. Saíram os dois com sorriso no rosto, andando abraçados, fruindo a vida. 

Lá pelas tantas se acabou o filme e o povo todo se levantou e bateu palmas, assoviou, gritou, tudo com amor e energia positiva. A salva de palmas durou muito tempo, foi bonito de ver. Parecia que queriam dizer em linguagem de palmas: isso sim é ordem e progresso. 

Palmas, palmas, palmas. Palmas para o Shoot The Shit e todo o povo que estava lá. Digo mais, vocês não são malucos e sim, podem mudar o mundo começando pela capital. 

Ah: da próxima vez que rolar um cinema na Restinga, no Partenon, na Redenção ou no Alegrete me convidem, quero estar junto! 

PS: eu também fui de bike.” 


Rodrigão Rodrigues, Porto Alegre, 18 de janeiro de 2013.

Texto escrito pós evento Cinema na Anita, do coletivo Shoot The Shit. Fotos do evento